Cesário Verde, morreu prematuramente
em Caneças (arredores de Lisboa) a 19 de
Julho de 1886, vitimado pela
tuberculose. Filho de um abastardo
comerciante, dono de uma loja de
ferragens da Rua dos Fanqueiros em
Lisboa e proprietário de uma quinta em
Linda-a-Pastora, começa a trabalhar ao
balcão, após o exame de instrução
primária, dedicando-se depois aos
negócios do pai, ao mesmo tempo que
efectua algumas viagens a Paris e
Londres. Em 1873, ano que publica os
primeiros versos na imprensa,
matricula-se no Curso Superior de
Letras, relacionando-se com Silva Pinto,
o amigo a quem se ficou a dever a edição
póstuma das suas poesias, que andavam
dispersas por jornais e revistas umas,
autografadas outras. Personalidade das
mais originais e renovadoras da poesia
portuguesas do século XIX, José Joaquim
Cesário Verde é pela sua grande lucidez
e invulgar consciência crítica um
precursor da modernidade e por
excelência o poeta de Lisboa e da
burguesia dos finais do século XIX que,
como Baudelaire, cultivou a dicotomia
cidade-campo. O contacto com o campo na
sua infância determina a visão que dele
nos dá e a sua preferência. Ao contrário
de outros poetas anteriores, o campo não
tem um aspecto idílico, paradisíaco,
bucólico, susceptível de devaneio
poético, mas sim um espaço real,
concreto, autêntico, que lhe confere
liberdade. O campo é um espaço de
vitalidade, alegria, beleza, vida
saudável… Na cidade, o ambiente físico,
cheio de contrastes, apresenta ruas macadamizadas/esburacadas, casas
apalaçadas (habitadas pelos burgueses e
pelos ociosos) e quintalórios velhos,
edifícios cinzentos e sujos… O ambiente
humano é caracterizado pelos calceteiros,
cuja coluna nunca se endireita, pelos
padeiros cobertos de farinha, pelas
vendedeiras enfezadas, pelas
engomadeiras tísicas, pelas
burguesinhas… É neste sentido que
podemos reconhecer a capacidade de
Cesário Verde em trazer para a poesia o
real quotidiano do homem citadino. Ao
ler-se o poema "De Tarde", pertencente a
"Em Petiz", é visível o tom irónico em
relação aos citadinos, mas onde o tom
eufórico também sobressai, ao percorrer
os lugares campestres ao lado da sua
"companheira". A preferência do poeta
pelo campo está expressa nos poemas "De
Verão" e "Nós" (o mais longo), onde
desaparecem a aspereza e a doença
ligadas à vida citadina e surge o elogio
ao ambiente campesino. A arte de Cesário
Verde é, pois, reveladora de uma
preocupação social e intervém
criticamente. O campo oferece ao poeta
uma lição de vida multifacetada (por
exemplo, os camponeses são retratados no
seu trabalho diário) que ele transmite
com objectividade e realismo. Trata-se,
pois, de uma visão concreta do campo e
não da abstracção da Natureza. A força
inspiradora de Cesário é a terra-mãe,
sendo nela que Cesário encontra os seus
temas. É por isto que, habitualmente, se
associa o poeta ao mito de Anteu (*).
(*) Anteu: Na mitologia berbere,
Anteu era filho de Posídon e Gaia.
Casou-se com Tinjis. Extremamente forte
quando estava em contacto com o chão (ou
a Terra, a sua mãe), ficava extremamente
fraco se fosse levantado ao ar.
Desafiava todos os seus possíveis rivais
para combates corpo a corpo que
terminavam invariavelmente com a morte
do seu adversário. Um dos seus
objectivos era utilizar os esqueletos
dos viajantes que matava para edificar
um templo em honra do deus seu pai. No
entanto, Héracles/Hércules conseguiu
descobrir o seu calcanhar de Aquiles e
conseguiu derrotá-lo. Hércules descobriu
que nunca conseguiria vencer Anteu
atirando-o contra o chão, assim como
Anteu não conseguia derrotar Hércules
esmagando-lhe o crânio. Héracles
conseguiu a morte de Anteu, levantando-o
do chão, mantendo-o suspenso até à
morte.O mito tem sido utilizado como
fábula que simboliza a força espiritual
que é mantida pela fé nas coisas
imediatas e factuais - as coisas
terrenas.
Plínio, o Velho, citando Euanthes,
escreveu, na sua História Natural (viii.
22), que um homem da família de Anteu,
depois de escolhido por algumas pessoas,
foi levado para um lago da Arcádia, onde
pendurou as roupas num freixo,
atravessando o lago a nado. Foi, por
conseguinte, transformado num lobo,
tendo vagueado nessa forma por nove
anos. Se conseguisse passar esse tempo
sem atacar um ser humano, poderia voltar
a atravessar o lago a nado e tomar a sua
forma humana original. É um dos
primeiros relatos sobre licantropia que
se conhecem. Na Divina Comédia, Anteu
assume a forma de um gigante que guarda
o nono círculo do Inferno. É ele que
levará Dante e Virgílio até ao fundo
desse círculo onde corre o rio gelado do
Cocito.
Obra de Cesário Verde:
Eu
e ela (13/2/95)
Arrojos
(15/5/95)
O
Sentimento dum Ocidental (28/8/95, 5,11,18/9/95)
Manias!
(7/10/96)
Lúbrica
(4/1/99)
Contrariedades
(25/1/99)
Eu,
que sou feio... (07/10/02)