Nos seus primórdios, a enfermagem, tinha
estreita relação com a maternidade, e era
exclusivamente feita por mulheres. Desta
"selecção exclusivamente para mulheres", a
enfermagem prosseguiu, de novo pelas
mulheres que exerciam a profissão mais
antiga do mundo, prostituição, alargando a
prestação de cuidados ao sexo masculino, dos
moribundos da guerra. Eram escolhidas as
prostitutas por estas conhecerem melhor que
as outras mulheres o corpo dos homens, em
todas as suas vertentes, íntima também e
como forma de reintegração destas à
sociedade. A enfermagem moderna, com a suas
bases de rigor técnico e científico, começou
a se desenvolver no século XIX, através de
Florence Nightingale, que estruturou seu
modelo de assistência depois de ter
trabalhado no cuidado de soldados durante a
guerra da Criméia. a sua assistência baseada
em fatos observáveis prestou valiosos
contribuição na recuperação dos moribundos,
e iniciou uma nova vaga do conhecimento em
enfermagem, através do carácter científico
que lhe impunha. Caracteriza-se por
efectuação de registos clínicos, dando
origem à implementação do, ainda actual, e
mundialmente adaptado, processo clínico do
doente.
Florence Nightingale - A mãe de Enfermagem
Moderna
A 12 de Maio de 1820 nasceu a mulher que
haveria de ficar para a história como a mãe
da enfermagem moderna: Florence Nightingale.
Em sua homenagem instituiu-se essa data como
Dia Internacional do Enfermeiro.
Durante a guerra da Criméia, esta enfermeira
inglesa de ascendência italiana levou a cabo
uma verdadeira revolução no hospital militar
do exército inglês na Turquia (1854),
transformando por completo a tradicional
prática da enfermagem.
Florence Nightingale introduziu mudanças
qualitativas ao nível da prestação de
cuidados de saúde aos soldados, melhorando
as condições sanitárias e de higiene e
implementando medidas que foram ao encontro
das necessidades dos pacientes e
contribuíram para lhes proporcionar mais
qualidade de vida em períodos de
convalescença. No prazo de dois anos,
Florence e a sua equipa de enfermeiras
conseguiram baixar a taxa de mortalidade do
hospital de 40 para a penas 2 por cento,
provando que a enfermagem assumia um papel
fundamental na prestação de cuidados de
saúde. O trabalho rigoroso de Florence
Nightingale e o sucesso das medidas que
adoptou levaram-na a criar, em 1860, no St.
Thomas Hospital, em Londres, a primeira
escola de enfermagem, verdadeiro modelo
inspirador do ensino da profissão no
Ocidente.
Actualmente, a enfermagem é uma profissão
especializada e altamente rigorosa e cujo
desempenho assume uma importância fulcral no
funcionamento dos sistemas de saúde e na
qualidade dos cuidados disponibilizados aos
cidadãos.
Governo alheio às necessidades da população:
No entender da generalidade dos enfermeiros,
o recente diploma relativo á rede de
cuidados de saúde primários caminha no
sentido oposto, confinando os Centros de
Saúde a uma resposta quase exclusivamente às
situações de doença. Ficam confinados a
responder às situações de doença. Só que a
saúde não se limita à doença, e a doença,
por sua vez, exige em muitos casos, uma
continuidade de cuidados – tratamentos e
assistência domiciliária. Entretanto, com a
entrada em vigor do modelo de "empresarialização"
dos Hospitais poder-se-á assistir a altas
precoces dos doentes submetidos a
intervenções cirúrgicas nas unidades
hospitalares. Perante estas situações,
levanta-se uma questão fundamental: quem irá
assegurar a continuidade de cuidados na fase
da convalescença, designadamente quando se
trata de pessoas que vivem sós?
Para assegurar o vasto e amplo
conjunto de respostas de saúde que a
comunidade necessita, é imprescindível
reforçar a intervenção especializada dos
enfermeiros na prestação de cuidados às
famílias. Em países com sistemas de saúde
muito evoluídos (como é o caso da Finlândia,
Suécia, Alemanha, Áustria e Irlanda), com
uma filosofia assente numa importante rede
de cuidados de saúde primários – prevenção
da doença e do bem-estar –, verifica-se que
o número de enfermeiros é muito superior ao
de médicos, sendo a intervenção da
enfermagem comunitária, decisiva para a
obtenção dos elevados indicadores de saúde
aí existentes.
O Dia Mundial do Enfermeiro na Brasil, foi
instituído pelo Presidente Getúlio Vargas
através de decreto-lei em 1938. E é
comemorado no dia em que nasceu Florence
Nightingale, considerada a fundadora da
enfermagem moderna.
Além da data, a profissão também é
homenageada na Semana Brasileira de
Enfermagem, instituída pelo presidente
Juscelino Kubitschek por decreto-lei. De 12
a 20 de Maio, os conselhos regionais de
enfermagem promovem encontros, palestras e
outras actividades para avaliar e divulgar a
profissão.
Ana Néri 1814 - 1880
Faltavam doze dias para o Natal do ano de
1814, quando uma menina, depois chamada
pelos pais de Ana, nasceu em terras
brasileiras, mais precisamente em Vila
Cachoeira do Paraguassu, na Bahia.
Casando-se muito jovem e ficando viúva aos
trinta anos, do Capitão-de-Fragata Isidoro
António Néri, Ana Justina Ferreira criou
três filhos: Isidoro António Néri Filho e
Justiniano de Castro Rebelo, ambos médicos
militares, e um cadete, Pedro António Néri,
todos convocados para a Guerra do Paraguai.
Como Florence Nightingale, Ana vinha de uma
família distinta e de posses,
possibilitando-lhe, assim, ter uma boa
educação e instrução. Seguindo o exemplo de
suas precursoras, Ana queria abraçar a vida
de corpo e alma. Conhecer e acompanhar os
seres humanos nos seus momentos de verdade.
Nos seus momentos de dor. Era mais um dia de
despachos no Palácio do Governo. A
correspondência chegava pontual e numerosa
como sempre. Como de costume, o secretário
abria os envelopes seleccionando o material
a ser lido pelo então Governador da Bahia,
Manuel Pinto de Sousa Dantas. Remetente: Ana
J. F. Néri. Deve ser mais algum pedido
particular, algum problema a ser resolvido
para algum conterrâneo baiano, pensou o
Governador. Mas finalizada a leitura da
carta, percebeu ser digna de muita
consideração. Eis o teor da mesma:
"Exmo. Sr.
Tendo já marchado para o exército dois de
meus filhos, além de um irmão e outros
parentes, e havendo se oferecido o que me
restara nesta cidade, aluno do sexto ano de
Medicina, para também seguir a sorte de seus
irmãos e parentes na defesa do país,
oferecendo seus serviços médicos, como
brasileira, não podendo resistir à separação
dos objectos que são caros, desejava
acompanhá-los por toda parte, mesmo no
teatro da guerra, se isso me fosse
permitido; opondo-se a esse meu desejo, a
minha posição e o meu sexo me impedem,
todavia, que eu ofereça meus serviços em
qualquer dos hospitais do Rio Grande do Sul
onde se façam precisos, com o que satisfarei
ao mesmo tempo aos impulsos de mãe e aos
deveres de humanidade para com aqueles que
ora sacrificam suas vidas para honra e brio
nacionais e integridade do Império.
Digne-se V. Excelência de acolher benigno
este meu espontâneo oferecimento ditado
tão-somente pela voz do coração.
Bahia, 06 de Agosto de 1865"
Era mais um voluntário. Ou melhor, uma
voluntária, oferecendo seus conhecimentos,
sua boa vontade e dedicação ao Exército
Brasileiro, aos defensores da Pátria, para
amenizar os sofrimentos decorrentes da luta.
Era o ano de 1865, da discórdia política e
consequentes baixas em exércitos vizinhos.
Paraguai, Brasil, Argentina e Uruguai,
viram-se envolvidos em lutas que duraram
cinco anos. Para essa guerra, com excepção
da marinha, o Brasil não estava
convenientemente equipado. Faltava um
exército numeroso. O mesmo notava-se nos
serviços médicos. O serviço de saúde
ressentia-se da falta de médicos-cirugiões,
farmacêuticos e enfermeiros. Os hospitais de
sangue tinham de acompanhar os batalhões
empenhados no luta. Eram, por isso,
hospitais de campanha - e isto evidencia seu
carácter de emergência - instalados em
barracas e sempre mal providos de recursos.
A falta de auxiliares era enorme. Os
próprios médicos e farmacêuticos tinham de
ser também enfermeiros muitas e muitas
vezes. Era, além disso, preciso recorrer a
soldados sem nenhuma prática, para cuidar
dos feridos e assistir aos doentes. As
condições sanitárias dos hospitais não eram
nada promissoras. O corpo de saúde do
exército imperial era pequeno e a pobreza de
material extrema. Qualquer ferimento podia
ser mortal, por imperícia do cirurgião ou
penúria da farmácia. O confinamento, a
humidade, a promiscuidade, a falta de
higiene faziam inevitáveis doenças mortais
como a gangrena. As funções de enfermagem
eram relegadas a um plano doméstico ou
religioso, sem nenhum carácter técnico ou
científico. Até então eram apenas homens que
serviam de enfermeiros nos hospitais
militares. E será nos hospitais
improvisados, construídos sob ordens do
então Mar. Luís Osório, nas cidades de
Corrientes, Humaitá e Assunção, que uma
mulher mostrará toda sua abnegação e
piedade, tornando-se o símbolo da enfermeira
do Brasil. Quando eclodiu a guerra em fins
de 1864, Ana contava com cinquenta anos.
Viúva e mulher de posses, ela estava
disposta a acompanhar os soldados
brasileiros em cada passo por terras
estrangeiras. Sentia-se, desse modo,
participante dos acontecimentos em que seus
filhos também estavam envolvidos: um na
activa militar e os outros dois na prática
de estudos de Medicina. Da luta também
participavam Manuel Jerónimo Ferreira e
Joaquim Maurício Ferreira, ambos oficiais do
exército, e irmãos de Ana. Um sobrinho
também já seguira para a frente como
voluntário da Pátria, morrendo em combate.
Pouco sabemos de sua vida particular e, numa
tentativa de aprofundar nossos
conhecimentos, ficamos a pensar quais teriam
sido seus verdadeiros sentimentos. Teria ela
decidido oferecer-se como enfermeira
participando, assim, de uma das mais
perigosas e insensatas actividades humanas,
se não tivesse nela seus filhos? Não teria
sido unicamente seu amor de mãe a força
propulsora da coragem de ver de perto a
guerra que seu País então enfrentava? Ou ,
quem sabe, teriam sido ambos sentimentos de
amor materno e solidariedade aos soldados
brasileiros?
Todos os dados que pudemos colher sobre sua
vida nos levam a crer que sim. Amor materno
e amor pátrio encontraram seu melhor
representante na pequena figura que
circulava activamente nos principais locais
onde os brasileiros lutavam.
Aceito o seu oferecimento, embarcou Ana Néri
no dia 13 de Agosto de 1865 para os campos
de batalha. Nunca tendo antes deixado a
Bahia, Ana abandonou o conforto de seu lar,
partindo para Corrientes, seu primeiro posto
de atendimento e onde havia, por essa época,
cerca de seis mil soldados internados e uma
poucas irmãs de caridade, da Ordem de S.
Vicente de Paulo. Daí passou ao Salto,
Humaitá, Curupaiti e Assunção. Montou com
seus próprios recursos e na própria casa em
que morava, uma enfermaria limpa e modelar e
aí trabalhou abnegadamente, até o fim da
guerra. Onde não havia hospitais,
improvisava um. Tão querida se tornou dos
oficiais e soldados, que todos lhe chamavam
"mãe".
Ela venceu preconceitos, desprezou
conselhos, enfrentou mil desconfortos de
viagens. Viu-se, após longos dias de
ansiedades, entre os batalhões dos
voluntários da Pátria e dos soldados
nacionais, que se batiam em defesa do
Brasil. Era de vê-la, num acanhado hospital
de campanha, quase sem tempo de alimentar-se
ou repousar, cuidando de feridos e enfermos,
desvelada e caridosa, paciente e maternal.
Enquanto, não muito longe, estrondeava o
combate, os canhões reboavam, os clarins
transmitiam ordens de comando, os tambores
rufavam frenéticos e os comandantes, lutando
também, exaltavam o ânimo dos soldados aos
toques de avançar, a enfermeira Ana Néri,
dirigindo outros enfermeiros e atendendo aos
feridos que chegavam carregados em padiolas,
multiplicava-se em cuidados, atenções e
trabalhos, entre lamentos, gemidos e sangue.
Balas inimigas silvavam por cima da
cobertura de lona do hospital. Muitas
perfuravam os panos e atravessavam o
recinto, ferindo os já feridos, ou matando
os agonizantes. Entretanto, a valorosa
patrícia não se intimidava. Prosseguia no
seu arriscado, comovente e vaidoso mister de
ânimo forte. Estava servindo a Pátria na
protecção a seus defensores; e achava-se
colocada à altura de seus dois filhos
médicos, que também se tinham apresentado
como voluntários para servir nos hospitais
de sangue. Honrava-se ela de seus filhos, e
estes se orgulhavam da sua progenitora,
prestimosa, caritativa, resoluta e patriota.
Dedicação, desvelo, piedade, humanitarismo,
carinho, todos esses adjectivos e outros
mais que lhe foram atribuídos. Pensava,
curava, cerrava as pálpebras dos moribundos,
levando-lhes palavras de consolação e
enxugando suas lágrimas. Sua dedicação era
tal que, caso não tivesse lugar nos
hospitais, levava feridos à sua residência.
E assim, não havia quem não a conhecesse.
Segundo ela, só voltaria depois da completa
derrota do inimigo, e assim cumpriu.
Regressando com o pesar do falecimento de um
dos seus filhos, mas sem imprecar contra a
desgraça e mal dizer a luta que lhe roubara
um pedaço do seu corpo e alma, escondia as
lágrima e, sorrindo, para as glórias da
Pátria, abençoava o dever que assim a
separava de um filho. Exemplo de mãe e de
virtudes cívicas, seu corpo parecia pequeno
para alma tão grande, mas ele era apenas uma
forma de mostrar um espírito gigantesco.
De volta a Pátria, recebeu homenagens
nacionais. Na Bahia, as mulheres
ofereceram-lhe uma coroa de louros cravejada
de brilhantes. Foi condecorada com medalhas
de Prata, Humanitária e da Campanha e
recebeu uma pensão vitalícia do imperador.
Com esse dinheiro educou quatro órfãos de
guerra, cujos pais caíram em campos de
batalha no Paraguai.
Faleceu aos 65 anos de idade, a 20 de Maio
de 1880, sendo enterrada no Cemitério de São
Francisco Xavier no Rio de Janeiro.
Foram-lhe prestadas diversas manifestações
de apreço em várias províncias. Seu retrato
de corpo inteiro, obra de Vitor Meirelles,
figura em lugar de honra no paço municipal
de Salvador. A primeira escola oficial de
enfermagem de alto padrão, fundada por
Carlos Chagas em 1923, tem, desde 1926, o
seu nome. Em 5 de Fevereiro de 1979 seus
restos mortais foram transladados para sua
terra natal.
Considerada a precursora da Cruz Vermelha
Brasileira, foi cognominada de "MÃE DOS
BRASILEIOS", figurando nas páginas da nossa
história como um dos mais belos exemplos de
abnegação, caridade e amor à Pátria.