SEBO LITERÁRIO

 

 

Crônicas e Artigos
Profª Augusta Schimidt

PÁGINA
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O sentido da vida
Augusta Schimidt


A vida é estranha. Geralmente ficamos obcecados por grandes feitos quando na verdade é a combinação de coisas pequenas que tornam as coisas grandes possíveis.
Invariavelmente tentamos criar nossos próprios mundinhos para termos a ilusão de que controlamos a nossa existência achando que a individualidade é a nossa essência, mas nos afetam as discordâncias sem percebermos que são as diferenças que tornam a vida interessante.
Quando criamos o nosso mundo, construímos nele barreiras defensivas em torno de nossos sentimentos para justificar o medo que sentimos de sermos próximos de alguém.
Para descobrirmos o verdadeiro sentido da vida, temos que olhar com mais clareza para dentro de nós mesmos e nos descobrirmos dentro deste universo chamado Vida.
E é importante demais que consigamos ouvir o eco da voz que se chama consciência, pois é ela quem nos fará ouvir as verdades.
Muito se fala sobre o tema Vida.
Dizem que vida é sabedoria, é coisa profunda, é ter família e perpetuar a espécie. Eu digo que vida é amor. Amor em todas as suas frágeis formas, força poderosa e duradoura que dá sentido real a todas as vidas.
É o amor que nos impulsiona a celebrar a vida, nos faz ser criativos, é a força que nos diz que se há coisas pelas quais vale a pena morrer, há muito mais coisas pelas quais vale a pena viver.
Outro dia me deparei ouvindo um relógio dentro de mim. Um relógio de vida que todos temos e que faz a contagem regressiva do tempo que nos resta. Um dia ele para e ninguém contesta... Foi então que entendi que não dá para perder um segundo. Cada tic tac é precioso demais e nos dá a certeza de que temos que fazer o que nos deixa feliz.
Pena é que muitos de nós, preocupados com o que os outros vão dizer ou pensar, deixamos de abrir as asas. Os enganos são parte da vida, os erros do passado já não precisam ser castigados. A rejeição e a resistência sempre serão inevitáveis quando fazemos algo especial, portanto não adianta nos perguntarmos a todo o momento se fizemos certo ou errado. Sempre teremos a resposta em nosso coração...
E quando nos virmos cercados de pessoas querendo nos ver fracassar ou fazer menos, é importante seguirmos caminho mesmo sendo ele difícil.
Sempre teremos um dia Não, mas o importante é sabermos que sempre haverá o dia Sim...
Quando nos olharem com estranheza, achando que sabem onde queremos chegar, é exatamente quando temos que lutar. Nunca desistir é o lema, pois é quando lutamos que nossos sonhos se realizam e então temos a certeza de que lutar valeu a pena, pois é com a vitória que saboreamos cada gota de vida que nos resta.

Para refletir...
Augusta Schimidt


Confesso que hoje foi um dia difícil. Passei a tarde a espera de um milagre... Que não aconteceu.
Triste e displicente passei os olhos num jornal de ontem que estava em cima da mesa e parei os olhos numa manchete que dizia Eco. Bom, já que meu milagre não aconteceu que mal haveria em doar uns minutos numa leitura que até podia ser interessante. Pois é... E lá vem a vida mostrando aquilo que a gente precisa ver...
Li uma historinha interessante que vou transcrever aqui:
“Um certo menino que morava numa fazenda, todos os dias quando ia à escola, passava em frente a uma mata.
Um dia ele contou à mãe que naquela mata morava um menino muito mau, que só sabia falar palavrão e que não queria mais ir a escola para não ser xingado por ele.
A mãe refletiu, e com o pensamento de uma sábia disse:
Filho faça o seguinte: amanhã, quando você chegar a mata, antes que ele comece a te xingar, comece a gritar bem alto que ele é um menino legal, bonito, inteligente, amoroso, e que você gostaria de brincar com ele, etc, etc...
No outro dia o menino assim fez e quando voltou para casa a mãe lhe perguntou como havia se comportado o menino mau da mata. O filho contou que naquele dia ele estava bonzinho e tinha dito que ele era inteligente e que queria fazer amizade com ele.
A mãe o incentivou a repetir tudo nos próximos dias.
Certo dia, o menino confidenciou à mãe: Aquele menino da mata deve ter levado uma bronca ou uma boa surra do pai dele porque ele anda tão bonzinho! A sábia mãe desde o primeiro momento percebeu que se tratava do eco que a voz do filho produzia na mata.
É impressionante a quantidade de vezes que reclamamos das palavras e comportamentos dos outros sem nos darmos conta de que são o eco das nossas próprias palavras e comportamento.
Certa vez li no livro da Sabedoria que recebemos o eco das nossas ações. Estava ocupada demais pra lembrar disso.
“A palavra branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira”.
Xingar gera xingamento em intensidade igual ou maior ao passo que o amor diminui a tensão e a agressividade.”
A partir de hoje, sempre que passar na “mata” vou dizer...
Eu te amo...

Pássaro mulher
Augusta Schimidt


Um dia voei... Ergui-me em vôo altaneiro por sobre as ondas do mar e nas trilhas dos raios de sol vi o verde das matas.
E como pássaro, banhei-me em cachoeiras puras de águas cristalinas e o verde refletiu em mim a natureza.
Minhas asas batiam forte, até que aprendi não ser a força que move as montanhas...
Aprendi, batendo as asas, o poder da suavidade e deixei-me penetrar por ela e foi então que meu vôo ficou mais leve e as montanhas vieram ao meu encontro, mais verdes...
Voei céu, voei mar, sequei minhas penas ao sol, protegi-me do vento norte e cresci em meio à paisagem.
Conforme crescia, minhas asas eram aparadas e os vôos tornaram-se rasos e circulares.
Cai algumas vezes, mas a esperança me levantou e eu segui em frente.
Explorei mundos escolhi um galho e me estabeleci. Formei um ninho, mas um vento forte derrubou minha cria... Sofri...
Mas o céu continuou a brilhar azul e o sol retornou ao amanhecer. Novamente voei.
Arrisquei um vôo mais alto, consegui!
Vi os clarões da cidade, penetrei nela feliz. Era uma cidade rosa, azul, lilás... Lá eu pude descansar meu corpo de pássaro já maduro.
Certo dia, vindo de longe, uma chuva de estrelas cintilantes aportou em meu coração. Assustei e bati novamente as asas para procurar um abrigo seguro. Voei baixo, amedrontada e encontrei uma fresta de sol.
E desta fresta iluminada surgiu a poesia encantada que me fez refletir. E refletindo entendi o convite cálido, o abraço afetuoso e doce. E uma onda de ternura me envolveu as penas fazendo-me acreditar na vida.
Agora adormeço embalada nos braços do abraço...


A Palavra e o silêncio
Augusta Schimidt


“Pior do que a voz que cala é o silencio que fala”
Sem conhecer a força das palavras é impossível conhecer as pessoas, disse Confúcio.
A palavra faz parte de nossa essência. Com ela nos emocionamos, fazemos emocionar, consolamos e somos consolados, criamos , conquistamos, desfazemos enganos e também magoamos. Uma palavra mau dita, fere, aniquila, destrói, machuca a alma. Mas é sempre uma palavra e há sempre a possibilidade de se articular argumentos, de pedir perdão e perdoar.
Mas e o que dizer do silencio?
O silencio fala sobre o desinteresse, é um vazio que perpetua a dor. Ele arquiteta planos que não são compartilhados, é o vilão que abre as portas para o fim.
Depois de uma discussão o silencio é a sentença fatal, o desprezo total, deixa duvidas, e a dor é permanente. O silencio em determinadas ocasiões é crueldade.
Sei que há momentos em que o silencio é necessário. É o momento da paz, das boas lembranças, mas o silencio a que me refiro aqui é o silencio que fala, é o cemitério de nós mesmos, a tortura da mente cansada pelo medo do desamor.
O silencio a que me refiro é um eterno sussurrar da falta de esperança, é a voz que fala aos seus ouvidos o tempo todo que você não é nada, é a morte esperada.

Reencontro com a Esperança
Augusta Schimidt


Fechou o tempo, choveu forte a noite inteira. Era quase cinco da manhã, arzinho frio entrou pela janela me avisando da hora. Já não chovia mais.
Uma estrela pálida brilhava no céu, sozinha, perdida na imensidão...
Os pássaros madrugadores cantavam indolentes anunciando o dia. Preguiçosos pousaram na minha janela a dizer: “ vamos, acorda! O dia vem chegando...”
Saí de casa ainda estava escuro, mas tinha a companhia da estrela pálida. Éramos nós duas e a solidão...
Peguei o ônibus barulhento, cheirando a mofo e ao descer no asfalto já não via mais as luzes da cidade que acordava. Apenas uma pequena trilha cortava o mato molhado.
Desanimada percebi que a manhã havia chegado esfumaçada, a estrela se recolheu, não havia grilos nem vagalumes. Estava mesmo sozinha.
Encontrei pelo caminho uma árvore. Linda, viçosa...Meu coração apertou.
Naquele momento pensei no meu viver, no desgaste dos meus sonhos, nas dificuldades, nos desencontros... Melancólica busquei em algum lugar a esperança que julgava ter perdido.
Parei diante da árvore, acariciei seu tronco forte como a querer lhe roubar um pouco da energia que me faltava. E de suas folhas caíram gotas de água sobre meus cabelos como uma benção.
Foi então que um pássaro azul saiu de um galho da árvore abençoada e pousou numa pedra vestida de musgo. E dali voou, desbravando o céu festejando a liberdade.
Uma paz incrível me invadiu e pude perceber que estava feliz. Senti naquele momento mágico a presença do meu anjo. Pude ver o seu olhar a me dizer: “ Tem calma, pois tudo há de passar...”
Já não estava mais só. Reencontrei a esperança e juntas caminhamos rumo ao futuro com a certeza de que haverá tempo pra renovação.
O amor, a fé, a verdade nos leva ao caminho da paz. E a esperança nos dá a certeza de que sempre haverá um “amanhecer”...


Um rio...
Augusta Schimidt


Apenas um rio, caudaloso e belo. Um rio enorme onde do lado de cá não se vê o lado de lá.
Um rio de água viva ornado de arvores imensas, benditas, verdes de ver esperança que beijam o céu.
Um rio cheio de mistérios e desafios cercado de terra molhada beijada por suas águas.
Cenário sem igual...
Plantas carnívoras com fome de insetos, tapetes régios de vitória flor berçário de vida.
Aves coloridas que cantam a sinfonia do amanhecer saudando a chegada do sol que aquece a natureza.
Canoas remadas por gente nativa, seguindo trilhas enquanto a vida na selva se agita.
Do alto de uma cordilheira nasce um gigante com o coração generoso que entrega suas águas ao oceano... Rio Amazonas, um manancial de pura magia e riqueza.

Um rosto na multidão
Augusta Schimidt


Seu Manoel, um senhor de bastante idade, rosto cansado de tanto trabalhar, hoje sentou-se ao meu lado num banco da praça e por instantes ficou a me observar...
Quando me dei conta, estava falando com o senhorzinho que parecia adivinhar pensamentos.
Ele me perguntou o porquê de minha tristeza, se era saudade ou se era braveza. Eu ri e ele se pôs a tagarelar sem que eu tivesse a chance de me explicar.
Com sotaque português, mas já bem abrasileirado foi dizendo: Eu também sofro de saudades...
“Lá na minha terra, os portugueses celebravam a colheita da uva chamando vizinhos para um almoço especial.
Os lavradores passavam o dia dançando a chula, dança tradicional do Alto Douro.
Bebiam do melhor vinho, comiam febras, broas e azeitonas. “Ainda hoje a festa da Vindima continua sendo evento sagrado para pessoas de todas as classes sociais.”
Sou de Pombal, região de Leiria, disse-me ele e lembrou com melancolia quando o pai vendeu tudo que tinha na época do pós-guerra. Foi alguns anos depois que ele e a família, atravessaram o oceano para se estabelecer aqui no Brasil de toda gente.
Eu fiquei encantada com aquele senhorzinho falando com tanto amor de seu Portugal.
E ele completou... Os portugueses têm historia e elas devem ser contadas às novas gerações.
Seguimos conversando e nem percebi o tempo passar.
Seu Manoel será mais um português a morar no meu coração. Sua simpatia me fez esquecer os motivos de minha tristeza. E a coragem e determinação dele, me incentivaram a lutar, pois naquela idade, ao se despedir me disse: Agora sigo em frente, minha jovem, pois ainda vou trabalhar...
Que maravilha! Não resisti e perguntei ao senhorzinho quantos anos tinha e ele todo orgulhoso me respondeu... Apenas e ainda 80 anos.


Uma releitura para refletir...
Augusta Schimidt


Relendo em boa hora a fantástica obra de “A.O. Saraiva”, “Um sonho, um rascunho, um caminho...” Fez-me refletir se seria a idéia do autor _ Destino?
O dia sempre nasce por trás da cortina do mundo. E cada dia é um sonho novo que brilha aos olhos de quem vê enchendo o coração de quem vive...
Será sonho?
Ou um momento apenas no rascunho da esperança?
Um caminho novo talvez que o destino nos reserva como se fosse uma promessa de dias felizes... Talvez até seja um alerta para que troquemos o rastejar por passos firmes, marcando nossa existência. Um novo rumo a se tomar enfrentando o escuro com a luz de cada amanhecer e esperar o sonho novo crescer até o anoitecer...

(“”) A.O. Saraiva, autor do livro Um sonho, um rascunho, um caminho, um destino. Editado pela COOCESP – Cooperativa dos Cartunistas, Escritores e Poetas -2ª Ed. 1986

***Velhos violinos tocam musica...
(Inspirada no tema de Ruben Alves, arrisquei algumas notas no velho violino)
Augusta Schimidt

Meus pensamentos metidos a sonhos não esvaziam meu dentro a ponto de me tornar um ventre estéril.
Acredito na vida e negocio com ela o meu tempo. E o tempo vira domingo... Preguiçoso e lento... E eu vivo com gosto de busca, não me importa a idade.
A idade não se manifesta em fotografias amarelas, rugas ou cabelos brancos. Ela é como a musica que o violino toca, quanto mais executada mais afinada fica e os violinos velhos tocam musica... E da boa... A idade laça e abraça calmarias nas situações tempestuosas e dosa a sabedoria quando perdemos o rumo.
E quando o tempo passa da hora, sabiamente nos permite viver num piscar de olhos e ser feliz. Ser valente e ir em frente. Ir aonde nosso coração vai.
O tempo é o professor que nos ensina crescer, a conhecer o limite do fel e do mel, nos ensina a querer ser gente grande ou grande gente.
Sei que um dia terei que partir... Mas ficarão os pássaros, a musica tocada pelo velho violino, as lembranças, a memória, as historias e as saudades.
A morte é inegociável. Com ela não há suborno, por isso não tenho medo de morrer.
Tenho medo é de deixar morrer minha vontade de viver, de ter esperança...
Tenho medo é de não ouvir mais a musica tocada pelo velho violino.

 

 

LIVRO DE VISITAS