SEBO LITERÁRIO

por

Benedita Azevedo

 

CRÔNICAS


1. A VIDA SERÁ O QUE VOCÊ CONSTRUIR


No percurso do Colégio Estadual Mauá até minha casa, uma distância de aproximadamente 600 metros, vinha pensando na significação de uma existência.
A princípio, ainda pequenos, quando começamos a ter entendimento de que somos uma pessoa, dependemos inteiramente de nossos pais, quer sejam biológicos ou adotivos. Quando saímos para a escola e começamos a nos sociabilizar, aumentamos um pouco o nosso ambiente físico e também o relacionamento com pessoas que não pertencem à nossa família. Crescemos um pouco e chegamos à adolescência, fase de conflitos e incertezas. Chegando à idade da razão, temos que assumir nossos compromissos.
Para algumas crianças, a idéia de ir para a escola é encantadora, para outras um terror. Para as primeiras as descobertas do dia-a-dia somam alegrias às que elas têm em casa. Para as outras, as saídas de casa representam o afastamento daquilo que elas conhecem e confiam. Para umas a alegria das aventuras, das descobertas. Para as outras a chatice de sair de casa, tendo de se arrumar, fazer trabalhos, tudo é difícil.
Na adolescência, aquelas que aceitam naturalmente os fatos da vida, não percebem a diferença na passagem de uma fase para outra. Aquelas que fazem tudo de mau humor, reclamando de tudo, revoltam-se, passam por essa fase dando trabalho e preocupação aos pais. Sentem-se as pessoas mais infelizes do mundo.
Temos ainda, aquelas que recebem tudo de mão beijada. Não têm responsabilidade com nada. Os pais resolvem todos os seus problemas e lhes dão tudo o que necessitam e que não necessitam. Nesta terceira categoria, alguns se acomodam e aceitam a situação de maneira passiva, sem reação. Outros agem como verdadeiros ditadores. Acham-se no direito de exigirem, como se os pais tivessem de fazer o que querem, podendo ou não, levando aqueles que não têm firmeza a endividarem-se para realizar as exigências dos filhos.
As pessoas que aceitam tudo como um desafio e são mais agitadas, nem esperam chegar à maioridade para decidirem o que querem, e como sempre se dão bem. Podem tropeçar, mas acabam levantando e indo em frente. As outras tropeçam e desistem. Outros ainda, se acomodam e vivem à custa dos pais a vida inteira, sem objetivos definidos. Chegam a um determinado tempo que entram em depressão, vagam pelas ruas, buscam amigos da adolescência que, na maioria das vezes, estão cuidando da própria vida e não têm tempo para lhes dar atenção. Então arranjam desculpas para se lamentarem, colocam a culpa no governo, nas autoridades, nos pais e nos outros que não lhes ofereceram ajuda.
Aqueles que sempre tiveram responsabilidades e as aceitaram com alegria acabam formando uma bela família. Mesmo que tenham de trabalhar muito. Estão sempre felizes porque têm um objetivo definido na vida. Os acomodados podem formar uma bela família, mas não lhes dá valor e estão sempre em busca de uma liberdade que não sabem onde encontrar. Na sua ânsia de busca deixam passar as oportunidades de construírem um ambiente feliz para si e para as pessoas que os rodeiam. Passam por várias experiências e quando chegam à velhice lamentam o fato de estarem sozinhas ou maltratadas por pessoas que só lhes querem tirar vantagens. Dão sorte quando encontram, afetivamente, alguém que lhes compreenda as fraquezas e lhes dá carinho e compreensão, é claro, se encontrarem uma daquelas pessoas que foram habituadas a ter responsabilidade e caminhar com naturalidade.
Portanto, seja um vencedor. O importante na vida é ter um objetivo desde cedo. Criar na sua existência hábitos saudáveis que lhes possam oferecer uma referência positiva em qualquer que seja a fase pela qual está atravessando e que na velhice sirva de referência para as pessoas.

21.11.2002 – Publicado no Jornal Sexto Distrito – Magé - RJ
Benedita Azevedo


 

2. O ENSINO PÚBLICO PEDE SOCORRO


Enquanto o ensino público continuar do jeito que está, poucos alunos atingirão sucesso em vestibulares, concursos ou em qualquer emprego.
Sem um conteúdo adequado, como esses jovens chegarão ao final dos cursos? Como irão competir com os que estiverem mais bem preparados? Não há preocupação com a qualidade nem acompanhamento do que é ministrado. Os professores, mal remunerados, enchem-se de aulas e não têm condições de avaliar o que fazem e nem são cobrados. Ao final do ano, alguns aprovam todo mundo, outros reprovam a maioria e em duas aulas recuperam todos os alunos.
É fundamental que haja uma preocupação maior com a equipe de direção, para que acompanhe os trabalhos de todos os professores e procurem se inteirar dos conteúdos do núcleo comum nacional de cada área, para que possam verificar o andamento progressivo dos trabalhos.
As capacitações de professores perdem-se no vácuo da falta de cobrança. Os profissionais fazem os cursos, voltam para suas unidades escolares e continuam trabalhando exatamente como antes. Não há interesse nem organização para que eles sejam multiplicadores dentro da escola. Muitas vezes são até isolados do grupo. O Estado paga para a instituição uma capacitação para duzentos professores e só aparece 30% e nenhuma atitude é tomada. A instituição que ministrou os conteúdos recebeu o dinheiro e os profissionais continuaram no mesmo, ensinando para o seu aluno só aquilo que sabem e em alguns casos é bem pouco.
Há necessidade de os profissionais da educação acordarem para a responsabilidade que têm diante dos fracassos escolares. Um aluno não fracassa sozinho. Alguém deixou que ele chegasse ao Ensino Médio sem saber ler corretamente e o jogou para a frente no balaio de objetos sem qualidade, sem sequer, preocupar-se em lhe oferecer o mínimo, nem lhe fazer uma proposta para melhorar seu desempenho.
Os alunos também colaboram, achando que o importante é passar de ano com boas notas, não se preocupando se estão ou não preparados para enfrentar os desafios que terão pela frente. Embora a cada dia seja mais difícil conseguir um trabalho, muitos ainda não têm o senso de prepararem-se para competir com dignidade pelo seu lugar ao sol. Muitos preferem acomodarem-se e ficam à mercê de políticos para conseguirem um contrato temporário. Contribuindo para o fracasso educacional. Na hora dos concursos ficam sempre para trás.
Enquanto cada profissional somente fizer aquilo que quer e não o que deveria fazer, a educação continuará deixando muito a desejar. Serão poucos os alunos de escolas públicas que chegarão a ter sucesso somente com o que estudaram nessas escolas. Os mais persistentes continuarão buscando, perdendo um tempo precioso na conquista de seus objetivos, pela falta de qualidade do que lhes é oferecido, precisando repetir em cursos preparatórios o que deveriam aprender no curso regular.
É claro que temos exceções, como: O Pedro II, As Escolas Técnicas Federais, Os núcleos de Ensino Médio das Universidades Federais e Estaduais e muitas escolas públicas, onde a equipe de direção tem noção da importância de um acompanhamento cuidadoso e sistemático. Mas, infelizmente, muitas seguem de acordo com a visão de cada professor, sem o acompanhamento dos planos de ensino que ficam no papel. E quando somos avaliados, além fronteiras, ficamos com os últimos lugares.
Portanto, ao invés de pagarem uma verdadeira fortuna para uma instituição avaliar as escolas públicas, sem nenhuma coerência, seria muito mais proveitoso organizá-las com o corpo docente completo, com professores concursados, evitando contratos, muitas vezes daqueles professores que foram reprovados, nos concursos, enquanto os aprovados ficam esperando uma oportunidade que não vem.
Assim como uma casa, na mão de empregados sem orientação, acaba num caos, assim também, uma escola sem um corpo técnico: Diretores, Adjuntos proporcionais ao número de alunos, Orientadores Pedagógicos, Pessoal de secretaria em número suficiente, todos, conscientes da responsabilidade de terem em suas mãos o sucesso ou o fracasso de uma criança, de um jovem, de um adulto, acabam contribuindo para que milhares de pessoas desistam no meio do caminho, agravando um dos piores problemas do ensino público: a evasão escolar, ou cheguem ao final dos cursos sem nenhuma chance de vencerem os desafios do mundo moderno.
Sendo assim, o ideal seria que cada unidade tivesse os seus técnicos concursados e fossem preparados para acompanharem a estrutura escolar. Tanto no aspecto pedagógico como no administrativo. Organizando jornadas pedagógicas nas próprias escolas, no início do ano letivo e de avaliação e replanejamento no início do 2º semestre. Duas semanas de estudo dos parâmetros curriculares e de planejamento bem feito, salvariam todo o ano letivo. Mas, precisam ser realmente de estudos e planejamento e não de enrolação. Pode parecer incrível, mas há muitos professores e até diretores que até hoje não sabem o que são os Parâmetros Curriculares Nacionais. As Coordenadorias Regionais deveriam ser mais bem estruturadas, com supervisores em número suficiente, para acompanharem o desempenho de cada unidade com a seriedade que a Educação merece.

Praia do Anil, 20/02/2003
Benedita Azevedo


 

 

 

3. PROJETO, FOME ZERO


A maioria dos brasileiros sonha com um país onde todos possam ter três refeições diárias. Mas, para resolver o problema da fome no Brasil, há necessidade de muito mais que distribuir R$ 50,00 por mês para as famílias pobres. Muitos que não precisam tanto podem ser beneficiados, enquanto alguns que estão morrendo de fome ficarão sem receber nada. Nós que conhecemos o jeitinho brasileiro, sabemos que muita gente esperta desviará para os seus afilhados, recursos que não matarão a fome de ninguém. Mas comprarão carros, pagarão viagens, financiarão programas ilícitos de toda a ordem.
Fico muito preocupada com essa idéia de distribuir dinheiro de maneira generalizada. Sabemos que o Brasil é muito grande e será muito difícil uma distribuição justa. Podemos estar estimulando uma porcentagem muito grande de pessoas a se acomodarem, esperando receber do governo, o que sua família precisa, achando que é obrigação dos outros resolverem os seus problemas; e deixando de produzir, sobre-lhes todo o tempo para a marginalidade. Há a possibilidade de serem desenvolvidos grupos iguais aos sem terra, que julgando-se injustiçados, invadem propriedades alheias, numa exigência, como se eles tivessem trabalhado a vida inteira e aqueles donos de propriedades, que muitas vezes trabalharam muito para construir um patrimônio, lhes tivessem roubado o fruto do trabalho. Haverá sempre alguém mal intencionado para aliciá-los.
O ideal seria criar fontes de trabalho em todos os municípios brasileiros, sob a orientação das prefeituras, que já possuem as suas estruturas, evitando formarem-se mais e mais grupos com acesso a essa distribuição e o aumento do número de pessoas que provavelmente desviarão e manipularão os recursos destinados ao programa.
O estudo para acabar com a miséria passa pela necessidade de um sério projeto de planejamento familiar. Um projeto educativo que mostre principalmente ao sexo feminino, que não pode simplesmente, engravidar e jogar crianças ao mundo, sem saber como criá-las. Não podemos conceber uma mulher sozinha, morando num barraco com cinco ou dez filhos. Não depois de termos tantos recursos para o controle voluntário da natalidade. Precisamos de um programa de orientação social que esclareça a elas, da necessidade de fazerem esse controle. Mas há necessidade de se fazer um acompanhamento sistemático. Muitas recebem o remédio, tomam um ou dois comprimidos, e por ignorância, acham que não precisam mais do que isso por mês. Depois engravidam e dizem que o remédio não deu certo.
Como é que uma mulher sozinha tem o primeiro filho com toda dificuldade, morando e alimentando-se precariamente, e continua gerando filhos e mais filhos, sem condições de cuidar deles e de si mesma? Será que elas geram tantos filhos na tentativa de agradar e prender um parceiro e depois se vêm sozinhas, tendo de cuidar de todos? E no desespero, sem nenhuma condição de mantê-los, mandam todos para a rua, se arranjarem do jeito que podem? Ou será que os geram já pensando na possibilidade de todos irem para a rua e quantos mais forem mais coisas trarão para casa, sem pensarem nos riscos que correm e nas conseqüências de uma vida sem nenhuma estrutura?
Esta situação, expõe as crianças a todo tipo de perigos, acabando presas fáceis de todo tipo de exploração, inclusive do tráfico e da prostituição infantil.
Por tudo isto, é muito importante que ao mesmo tempo que se combata a fome, criando oportunidades para que cada um trabalhe e construa a sua própria cidadania e se orgulhe disso, seja feita também, uma campanha educativa, para que os casais ou a mulher que resolva formar a sua família sozinha, tenham a consciência de ter poucos filhos: um ou dois, para que lhes possam oferecer o mínimo indispensável. Não só no que diz respeito à alimentação, mais também, à educação e saúde. Mesmo que precisem de ajuda para criá-los, será muito mais fácil do que se tiverem cinco, dez filhos. Onde comem ou estudam um ou dois, não comem nem estudam cinco ou dez.

Guia de Pacobaíba, 29 / 01 / 2003 – Publicado (Jornal Sexto Distrito, Magé - RJ)
Benedita Azevedo

 

 

 

4. AS DIFICULDADES DE SE CRIAR UM FILHO SOZINHA


Às vezes fico pensando nas mulheres que têm de cuidar dos filhos sozinhas, sem ninguém por perto, tendo de assumir todas as responsabilidades.
O pai, na maioria das vezes, dá uma pensão de dez por cento do que ganha, para cada filho. Essa quantia de acordo com o salário que recebe, pode ser muito pouco. Na maioria das vezes não dá nem para a alimentação. Todo o resto fica por conta da mãe: Moradia, escola, vestuário, remédios, material escolar, lanche escolar, brinquedos, lazer, condução, etc. Além de todo o tempo disponível dispensado aos filhos.
Somente quem cuida diariamente de uma criança é capaz de avaliar todos os problemas que tem de enfrentar uma mãe para educar um filho.
Desde a orientação com a higiene, hora de alimentação, acompanhamento escolar, no colégio e em casa, no trato com o material, com os deveres, no entendimento da matéria, a paciência de voltar à infância para melhor entendê-los. Há de se acompanhar o entendimento e nivelamento de diferenças educacionais, observadas nos ambientes onde têm de conviver, para que não julguem pelas aparências e aprendam a valorizar cada um na diversidade de hábitos, costumes e valores culturais adquiridos no decorrer da vida. Mas que também, saibam discernir o que é importante e o que é superficial em determinadas atitudes. O que merece cuidados e preocupações e o que pode ser ouvido e esquecido.
É muito fácil contribuir com certa quantia e achar que cumpriu suas obrigações para com os filhos. É muito fácil receber o boletim no final do bimestre e comentar com todo mundo que os filhos são inteligentes e maravilhosos, sem avaliar o acompanhamento que têm para alcançarem tais notas. É muito fácil recebê-los saudáveis duas vezes por mês e fazer comentários negativos sobre as pessoas que se dedicam em tempo integral à educação e ao bem estar deles. É muito fácil fazer-se de vítima quando nunca se deixou a própria individualidade em prol dos filhos. É muito fácil bancar o herói dois dias por mês, quando não se tem a preocupação de correr para o hospital, a qualquer hora, quando estão doentes e ficar com eles o tempo que for necessário, esquecendo todo o resto. O fato de estarem separados não exime os pais de cuidarem dos filhos menores quando eles precisam.
Por tudo isso, há necessidade de serem estabelecidas regras definidas na hora da separação. Principalmente, no que diz respeito à moradia, alimentação, educação e saúde para os filhos, se a mãe tem renda própria. Mas é fundamental que o direito dos filhos sejam preservados, quer em forma de bens imóveis, quer recebendo a porcentagem a que têm direito do fundo de garantia, em casos de desemprego do pai, para que a pessoa que detém a guarda não fique sobrecarregada, sem opções.

Maio de 2003 – Publicado (Jornal Sexto Distrito, Magé – RJ)
Benedita Azevedo

 

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