Sebo - Vilma Matos

Odisséia em Ulisséia

Recôndito

O que posso dizer
A respeito dessa ponte?
Mesmo não sendo literária
Inspira os amantes
A sonharem acordados!
Sendo sua verdadeira função
Diminuir a distância
Entre Lisboa e Almada.
Pode ser também o recôndito dos namorados
Na realização de seus encontros noturnos
Ou, nas manhãs ensolaradas!
Vilma Matos

Ponte 25 de Abril

A Ponte 25 de Abril, também conhecida como Ponte sobre o Tejo, foi inaugurada em 1966 como o nome de Ponte Salazar, em memória do ditador que a mandou construir.
Mais tarde, a ponte recebeu o atual nome em homenagem à 'Revolução dos Cravos' que aconteceu em 25 de abril de 1974. Esta foi uma revolução 'não sangrenta'. Na 'Revolução dos Cravos', os soldados puseram cravos no cano de suas armas, era a forma que encontraram para demonstrar suas revoltas contra a ditadura mais longa do mundo.
Nos finais de semana esta ponte, é particularmente procurada pelos habitantes de Portugal e pelos turistas vindo de toda parte do mundo.

Cidade de Almada

No lado de Almada poderá ver o monumento do Cristo Rei, semelhante ao Redentor no Brasil, virado para o Tejo. Se desejar fazer uma visita ao Cristo redentor terá que subir de elevador até cerca de 82m de altitude e, uma vez lá, de certeza que ficará completamente fascinado com a vista que pode ver sobre a cidade e sobre o rio.
Em Almada tiveram grandes escritores como, Fernão Mendes Pinto, Manuel de Sousa Coutinho (frei Luís de Sousa) e, esporadicamente, Gil Vicente (o pai do teatro português) autor do auto da Índia. A origem do nome: na etimologia da palavra divergem os estudiosos. Uns entendem se Almada corrupção de Vimadel, denominação que seria imposta pelos primeiros fundadores e significava terra de muitos; outros opinam que anteriormente à tomada de Lisboa, já ali havia uma pequena povoação mourisca, que a retomaram aos cruzados ingleses que haviam ajudado a conquistá-la; sendo depois reconquistada por um descendente destes últimos, de nome Almada. Sendo a cidade de Almada o mais belo miradouro da capital de Lisboa.
A atual a cidade de Almada tem um passado histórico, mais pela estada de reis, religiosos, escritores e artistas, que a escolheram para, nas suas quintas e palácios, passarem grande parte do tempo de repouso, do que propriamente pelos monumentos que nela foram edificados. Para documentar essas presenças, restam ainda algumas casas e quintas apalaçadas, bem como o castelo que se ergue no alto da cidade.

A vida continua...

Vivencie seus conhecimentos...
Não espere pela sorte.
Acredite na vida
Não tema a morte.
Ela só existe
Para quem não crer na existência
De outras vidas!
Busque a veracidade...
Antes da morte física.

Costa de Caparica

Cheguei na linda Vila da Costa de Caparica, por volta das dez horas.
Pensei na longa viagem que fiz de Lisboa até aquelas magníficas terras, parecia uma cidade descrita nos contos de fadas. A fadiga era visível, em meu rosto, pele ressecada pelo vento, lábios secos e roxos de frio retratavam o que minhas palavras não diziam. Além do mais, não era uma preferência minha usar sapatos fechados, eles me incomodavam, com todo exagero que me é peculiar, era uma verdadeira tortura, embora parecessem confortáveis. Diante de alguns contratempos, meu desejo era mesmo encontrar alguém que falasse meu idioma e pudéssemos comentar sobre o Brasil, inclusivo de suas belezas e riquezas naturais.
Apesar de toda a beleza que pude apreciar, nesta região de Portugal, não me sentia envolvida por completa, mas reconhecia que aquela ocasião era singular. Entrei numa atraente lojinha, confesso que era mais para fugir do frio, do que para fazer compras. De qualquer forma, não resisti aos encantos dos produtos regionais, terminei por comprar alguns.
Lembro-me, de ter visitado uma outra loja, e logo na entrada vi uma exposição de calças Jeans, cada uma mais linda do que a outra. Fui abordada por um vendedor, que a principio, pareceu-me educado e disposto a fazer boas vendas, mas, sem nenhuma explicação ele começou a exagerar em seus comentários, como: A senhora é brasileira? - Sou, qual é o problema? - É que o seu sotaque, ele é lindíssimo! Não dei muita importância ao que ele me perguntava ou dizia até que, escolhi algumas peças e quando me dirigi ao provador, escutei já bem perto do meu ouvido: _ “Você é uma mulher linda e se precisar da minha ajuda...!” Ao ouvir essa “parodia”, dei uma olhada por cima do ombro e, com a cara de quem não gostou da indesejada gentileza, respondi-lhe à altura. Muito agradecida, mas se por acaso, eu precisar de ajuda, chamarei meu marido, que está me esperando na loja vizinha. Contrariada com a ousadia, continuei andando em direção à cabine.
Fiquei tão enojada que nem experimentei as peças que havia escolhido, apenas as devolvi sem fazer comentário. O sujeito ficou todo atrapalhado, talvez tenha percebido o seu erro. Enquanto eu caminhava em direção à porta de saída, ele me pedia desculpas. Entrei em outro estabelecimento, se não me falha a memória, chamava-se Tutimoda. Mais à frente avistei uma loja que na exposição tinha algumas bolsas, então fui verificar os preços. A vendedora era brasileira e me atendeu com maestria, satisfazendo meu ego patriota. Gostei de quase tudo que foi mostrado, no entanto, poderia adquiri-los no Brasil, por um preço mais acessível.
O tempo “voava”, o que seria um minuto no Brasil, em Portugal parecia ser um segundo. Ansiosa, verifiquei as horas, constatei que se aproximavam das treze horas. Sem fome, mesmo assim, procurei um lugar para almoçar. Tinha muitas opções, então escolhi o restaurante Primavera, que ficava na Rua dos Pescadores, um almoço para uma pessoa custava 12,00 Euros. Na hora de pagar, fiz um teatro, não por considerar o preço fora da realidade, mas estava tudo tão calmo que resolvi fazer um pouquinho de confusão, só para quebrar o gelo e esquecer o sono e o cansaço. Finalmente, falei ao garçom que estava brincando. Pedi desculpas e sorrindo sai em direção à praia. Avistei uma placa e nela estava escrito:
“Costa de Caparica”. Olhei para um lado e para o outro. Vi um senhor de cabelos brancos se aproximando, então, criei coragem e lhe pedi que me tirasse uma foto encostada na placa indicativa... Agradeci e continuei minha solitária excursão.
Estava exausta e tudo que eu queria era retornar ao hotel, tomar um delicioso banho e repousar, para mais tarde, comparecer ao lançamento da Antologia “Poiesis”.
Durante o percurso de volta, senti sono e cheguei mesmo a cochilar dentro do autocarro (ônibus). Quando me dei por conta, estava novamente na Praça da Espanha. Despertei um tanto quanto assustada e fui imediatamente para o hotel.
Em tempos primórdios, a Costa de Caparica era quase deserta. De casa a casa tinha uma distância enorme... E de quando em quando, o vento açoitava os planos,
bramindo violento e juntando os seus estranhos e brutais queixumes às rebeldias do oceano. Pois foi, precisamente, nesse tempo que apareceu por ali uma criança bonita, mas andrajosa. Não se sabia de onde vinha nem a quem pertencia. E foi um velho da freguesia da Senhora do Monte, já então existente, que tomou conta dela.

Lenda da Costa de Caparica

O sol começara a declinar-se parecendo encher de fogo o horizonte, quando o homem descobriu uma pequenita sentada numa pedra do caminho e olhando aquele enorme balão de fogo que aparecia lá em baixo na linha do horizonte. Ele aproximou-se dela. A pequenita estava só. Então o velho fitou em seus curiosos olhitos e lhe falou: - Que fazes aqui? A pequenita estremeceu. Encarou-o sem medo e apontando com o seu magro dedito, explicou apenas: - Estou vendo aquilo. O velho indagou: - Está sozinha? _ Sim.
Era triste o tom daquela afirmação. O velho olhando a pequenita interlocutora, sentiu agitar-se dentro de si, o sagrado fogo da caridade. E com o auxílio do seu bordão, sentou-se ao lado da criança que lhe sorriu, exclamando: - Pobre menina! Conta-me a tua vida! Diz-me quem és... Talvez, eu possa ajudar a encontrar a tua família! A criança abanou a cabeça: - Não tenho família... nem sei quem sou. Ando assim desde que nasci... A única coisa que possuo é esta capa! ... O velho mirou a capa que a menina lhe estendia. A surpresa encheu-lhe toda a expressão: - Mas é uma capa muito boa, acredita! Deve ter pertencido a pessoas de haveres! Tu descendes da alta linhagem, com certeza! A menina encolheu os ombros. No seu pequenito rosto desenhava-se a incompreensão. O velho continuou: - Os teus antepassados foram pessoas da alta! Talvez gente da nobreza! Heim?
A menina sorriu: - “Senhor, não percebo as suas palavras, mas lhe estou muito agradecida, por ter sentado a conversar comigo! Então o velho perguntou-lhe: - E para onde tu vais agora? Ela encolheu, de novo, os ombros magros: - Sei lá! Por aí, a pedir uma esmolinha pelo amor de Deus! Mas, fique certo de que não o esquecerei o senhor é muito bom! O velho uniu as sobrancelhas numa atitude de reflexão. Algo de importante estava a ocupar-lhe o espírito, ficou silencioso durante alguns momentos. Depois, com um sorriso de felicidade a iluminar-lhe o olhar, ele afirmou: - Olha, minha filha... sou um pobre velho que não tem mais ninguém na vida. Hoje te encontrei e gostei disso. Se viesses viver comigo eu ficaria muito contente. Que dizes? A pequenita levantou-se tocada pelo entusiasmo: -
Obrigada! Farei o possível para que o senhor goste sempre de mim! E lado a lado partiram ambos, agora com a certeza de que não estavam sozinhos!
Passaram-se alguns anos. E tal como prometera comportou-se sempre como pessoa grata e amiga para com o pobre velho. Certo dia, o pobre homem viu chegando os seus últimos momentos. Então, chamou a rapariga, numa voz entrecortada pela agonia: - Anda cá, minha filha, já estás uma mulher, uma linda mulher... mas continuas pobre como eu... mal chega o que temos para tu comeres... A vida é assim, minha filha! Olha... faz-me um último favor ... eu sei que vou morrer... A rapariga interrompeu-o, embora a comoção lhe apertasse a garganta. Não diga isso. Não o deixarei morrer! Hei de tratá-lo como fiz até aqui! O velho fechou os olhos. Fez novo esforço para falar: - Não é necessário esconder-me a verdade. Quando se chega à minha idade sabe-se muito, mas vou dizer-te o que quero: deixa-me a tua capa para me aquecer, agora que sinto chegar o frio da morte!
A rapariga se apressou em atender-lhe o pedido: - Aqui tem a minha capa. Aqueça-se! Ela é tudo o que eu possuo... Que pena ser somente uma pobre capa! Fazendo um derradeiro esforço o homem explicou: - você se engana minha filha, esta é uma capa rica! Depois afastando a rapariga com um gesto, e diz: e agora vai... vai... deixa-me descansar, dormir, esquecer... O pobre velho morreu e a rapariga, em sinal de gratidão, juntou o magro dinheiro que restava para lhe fazer um sepultamento digno. Ela passou dias e noites sem comer e sem dormir, mas tinha a consciência tranqüila; fizera tudo o que lhe fora possível para corresponder ao auxílio que recebera quando criança. O tempo, no seu caminhar constante, impassível a quanto se passa à sua volta, indiferente a todos os gritos desesperados impondo-lhe a passagem ou o retrocesso, foi envelhecendo, também, a rapariga que há pouco, ainda era criança, agora em seu rosto bonito despontavam as rugas. E os cabelos brancos vieram a substituir-lhe os sedosos cabelos negros.
Mal arranjada, sem pouso certo, sem passado e sem história, a sua figura foi se tornando estranha e o povo acabou por lhe chamar de bruxa. Quando ela aparecia, os cães ladravam num medonho alarido! Um dia alguém quis segui-la para ver que rumo era o dela. Então descobriu que a mendiga ia apenas até ao alto do Monte, contemplava em redor toda à distância, num ar de êxtase e, depois, juntando as mãos como quem reza, murmurava voltando-se para o Céu, numa voz que nem parecia de velha nem de mendiga:
- Quando eu morrer, Senhor, fazei com que o Manto Divino de Nossa Senhora do Monte, cubra todas as povoações que vos veneram nesta freguesia e as quais enchem a terra de encanto! E por tudo eu peço que seja a costa agora a desabrochar, a primeira a receber os louvores do Céu e do Mar! Que eles a cubram com o ouro que anda a arder nas ondas e nas areias da sua praia bendita! A velha fechou os olhos continuando silenciosamente a sua prece. E então, a pessoa que a seguira correu a denunciar aos bruxedos sobre a pobre mendiga. E acrescentava: - No final daquelas rezas estranhas, ela segura a capa e ergue-a também ao Céu! A nova correu de boca em boca e chegou aos ouvidos do rei. E este impressionado com a história dos bruxedos mandou que a velha viesse à sua presença com a respectiva capa: - É verdade que fazes bruxedos com a sua capa? Ela olhou horrorizada para o seu interlocutor. – Não é real senhor... sou uma pobre de Deus... Nada quero com os bruxedos! O rei olhou para ela: - Então, porque fala sozinha? Cada vez mais surpreendida, ela respondeu: - Mas não falo, real senhor... rezo apenas! Mas o rei insistiu: - E essa capa que lhe cobre, não tem qualquer feitiço? Ela arregalou os olhos: - A minha capa? Oh, se ao menos fosse uma capa rica, mas bem a vedes, senhor... Está suja, cheia de remendos, velhinha! Trago-a comigo desde que nasci! Comovido, o rei olhou a velhinha com simpatia declarando: - Sim... Deve ser você que tem razão! Os outros não passam de mentirosos, uns cretinos e puxando por uma bolsa acrescentou: - Toma! Leva este dinheiro e vai! Estou arrependido de te ter obrigado a vir aqui. Com as lágrimas nos olhos a velhinha balbuciou: - Que Deus lhe pague, meu real senhor! Depois serenamente foi-se afastando do palácio real. Durante algum tempo não mais se ouviu falar na pedinte da Senhora do Monte, mas um dia, os sinos da igrejinha tocaram afinados. Uma alma subira para Deus. Mas quem?
A triste noticia correu depressa pelos arredores. Morrera a velha da capa como o povo lhe chamava. Morrera silenciosamente, assim como nascera, envolta na bruma do
mistério! Porém, qual não foi o espanto das pessoas que ocorreram ao tugúrio da velha, quando encontraram junto do corpo uma carta enviada a el-rei... Houve logo quem se prontificasse a ir ao palácio entregar tão estranha missiva. O rei entre comovido e admirado, leu o seguinte: - Meu real senhor! Deixo-vos a minha capa, como única recordação da minha passagem por esta vida! Só agora, na hora da morte, descobri que a minha capa, é, afinal uma capa rica, pois o meu benfeitor deixou-me uma pequena riqueza nos seus forros! De nada me serva, agora, esse ouro, real senhor, por isso, eu o entrego a vós, pedindo-vos uma grande mercê. Com esse ouro, transformai esta costa abençoada por Deus – numa terra de sonho e de maravilha, onde haja saúde e alegria para todos. E assim, surgiu, de facto, através da lenda e da história, essa terra de sonho e de maravilha que hoje se chama – Costa de Caparica – em homenagem a capa rica da pobre velhinha que certa vez apareceu ali, criança ainda e vinda não se sabe donde! (Dr. Gentil Marques – Lendas da Nossa Terra).

 

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